terça-feira, 10 de abril de 2012

Física Futebol Clube


Física Futebol Clube

Livro analisa futebol pela ótica da física e serve como ponto de partida para complementar conteúdo em sala de aula. Ao revisar conceitos abstratos de forma divertida, a obra busca atalhos para o coração dos jovens estudantes.

Por: Marcelo Garcia

Publicado em 03/04/2012 | Atualizado em 03/04/2012


Livro mostra como as leis da física regem cada lance do futebol. Seriam nossos craques, à sua maneira, gênios da ciência? (montagem: Marcelo Garcia; foto: Flickr/ c.alberto – CC BY-NC-SA 2.0)

Folha-seca, lambreta, chaleira, bicicleta, lençol, elástico, peixinho, da vaca, da foca, de corpo, de chapa, de letra e de placa – o que todos esses termos têm em comum? Se você respondeu que são jogadas do futebol, está apenas meio correto. Além de fazerem a alegria do povo nos campos espalhados pelo mundo, todas compartilham outra característica: só são possíveis graças às leis e propriedades da física. A relação natural entre a ciência e a arte do futebol é o foco do livro Física do futebol: mecânica.

Voltada principalmente para os alunos do ensino médio, a publicação é obra de dois veteranos – os físicos Emico Okumo, professora da Universidade de São Paulo (USP) por 40 anos, e Marcos Duarte, professor da Universidade Federal do ABC (São Paulo). A proposta é ensinar física de maneira divertida, buscando no mundo da bola exemplos que demonstrem conceitos abstratos aplicados a um universo próximo dos adolescentes.

São os ‘pernas de pau’ que, inutilmente, tentam contrariar as leis da natureza. O gênio domina a aplicação dessas leis e sabe todos os seus ‘senões’

Embora futebol seja um tema que não sai de moda nunca, compreender a física por trás de jogadas fantásticas torna-se ainda mais atual neste momento, em que o melhor jogador do mundo em atividade, o argentino Lionel Messi, não para de fazer história.

Ainda no aquecimento do primeiro capítulo, os autores defendem que, por mais que pareça desafiar as leis da física, o segredo do craque é justamente o contrário – são os ‘pernas de pau’ que, inutilmente, tentam contrariar as leis da natureza, enquanto o gênio domina a aplicação dessas leis e sabe todos os seus ‘poréns’.

Um caso já bastante explorado da interação clara entre física e futebol é o fascínio exercido pelos grandes batedores de falta, como o lateral Roberto Carlos (veja a análise física de um de seus incríveis gols) e o meio-campista Juninho Pernambucano, cuja versatilidade foi destacada por um físico inglês.

Esquema tático

Para dar o pontapé inicial em Física do futebol, dois craques: o ex-jogador Tostão e o físico Marcelo Gleiser são responsáveis pela apresentação do livro. A publicação é dividida em quatro grandes capítulos: Movimento, Força, Energia e Fluidos. Entre as questões abordadas pelos autores estão curiosidades como as diferenças de jogar na altitude, as mudanças inesperadas na trajetória da bola durante um chute com efeito e a interação de forças em uma dividida.


A cobrança de falta é um dos lances mais claros da aplicação da física no futebol. Na imagem, cobrança de Messi contra a Alemanha, na Copa do Mundo de 2010 – na ocasião, a Argentina acabou eliminada. (foto: Flickr/ seriouslysilly – CC BY-NC-ND 2.0)

Na busca por respostas, o livro aborda inúmeros conceitos que fazem parte do currículo do ensino médio, como atrito, aceleração, inércia, quantidade de movimento, resistência do ar, pressão, entre outros, de forma didática e sempre buscando exemplos relacionados ao mundo do futebol.

No meio de tanto conteúdo, há importantes e bem-vindos intervalos para retomar o fôlego, onde se apresenta um pouco da história do futebol e da ciência por meio de seus personagens. Os autores selecionam dois times de biografados para ninguém botar defeito: do lado dos cientistas, aparecem Joule, Bernoulli, Euclides, Descartes, Pitágoras e Galileu. Einstein e Newton completam o grupo.

Entre os boleiros, foram selecionados Charles Miller, Arthur Friedenreich, Mané Garrincha e seus dribles desconcertantes, Didi com seu chute folha-seca, além de Zico e da seleção brasileira de 1982. Na frente, é claro, sua majestade, o rei Pelé, e o escrete canarinho tricampeão mundial. No banco, os passes de calcanhar de Sócrates (que não ganhou uma minibiografia) e as histórias da bola e do futebol. Como todo brasileiro tem um quê de técnico, ausências de nomes como Roberto Dinamite, maior artilheiro do campeonato brasileiro, Rivelino e seus elásticos, o fenômeno Ronaldo ou Romário (de novo cortado da lista) serão sentidas.

Treino é treino, jogo é jogo

Apesar da informalidade, a obra assemelha-se a um livro didático temático, com muitas fórmulas. É preciso certo esforço para acompanhar a matemática exigida pela apresentação de conceitos e exemplos na ‘prancheta’ dos ‘professores’ – para só então sair ‘na cara do gol’ e deliciar-se com interessantes análises físicas de escanteios venenosos e chutes com efeito. Considerando-se essa proposta, a comissão técnica faz um bom trabalho, montando uma tática redondinha e que dá resultado – é realmente interessante rever conceitos de aula aplicados ao futebol.

Mas a estratégia poderia se mostrar um verdadeiro ‘carrossel físico’, no que diz respeito à ousadia e à inventividade, se o livro oferecesse mais exemplos e análises de lances reais do futebol – um tira-teima utilizando a supercâmera da física. O ‘gol de placa’ também bate na trave: há poucas propostas de exercícios práticos, que estimulem os alunos a levar a física do livro diretamente para o campinho mais próximo.

Apito final

Boa leitura extraclasse, Física do futebol revela as relações entre esses dois mundos muito próximos e pode ajudar alunos do ensino médio a compreender melhor a ciência. Também pode servir de base para a introdução de novas dinâmicas em sala de aula. Mas cabe ao professor superar a retranca e propor, ele mesmo, atividades que complementem essa experiência – só assim levantará a taça e conquistará mais torcedores para o Física Futebol Clube.

Marcelo Garcia
Ciência Hoje On-line

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