Física Futebol Clube
Livro
analisa futebol pela ótica da física e serve como ponto de partida para
complementar conteúdo em sala de aula. Ao revisar conceitos abstratos de forma
divertida, a obra busca atalhos para o coração dos jovens estudantes.
Por:
Marcelo Garcia
Publicado
em 03/04/2012 | Atualizado em 03/04/2012
Livro
mostra como as leis da física regem cada lance do futebol. Seriam nossos
craques, à sua maneira, gênios da ciência? (montagem: Marcelo Garcia; foto:
Flickr/ c.alberto – CC BY-NC-SA 2.0)
Folha-seca,
lambreta, chaleira, bicicleta, lençol, elástico, peixinho, da vaca, da foca, de corpo, de
chapa, de letra e de placa – o que todos esses termos têm em comum? Se você
respondeu que são jogadas do futebol, está apenas meio correto. Além de fazerem
a alegria do povo nos campos espalhados pelo mundo, todas compartilham outra
característica: só são possíveis graças às leis e propriedades da física. A
relação natural entre a ciência e a arte do futebol é o foco do livro Física
do futebol: mecânica.
Voltada
principalmente para os alunos do ensino médio, a publicação é obra de dois
veteranos – os físicos Emico Okumo, professora da Universidade de São Paulo
(USP) por 40 anos, e Marcos Duarte, professor da Universidade Federal do ABC
(São Paulo). A proposta é ensinar física de maneira divertida, buscando no
mundo da bola exemplos que demonstrem conceitos abstratos aplicados a um
universo próximo dos adolescentes.
São os
‘pernas de pau’ que, inutilmente, tentam contrariar as leis da natureza. O
gênio domina a aplicação dessas leis e sabe todos os seus ‘senões’
Embora
futebol seja um tema que não sai de moda nunca, compreender a física por trás
de jogadas fantásticas torna-se ainda mais atual neste momento, em que o melhor
jogador do mundo em atividade, o argentino Lionel Messi, não para de fazer história.
Ainda no
aquecimento do primeiro capítulo, os autores defendem que, por mais que pareça
desafiar as leis da física, o segredo do craque é justamente o contrário – são
os ‘pernas de pau’ que, inutilmente, tentam contrariar as leis da natureza,
enquanto o gênio domina a aplicação dessas leis e sabe todos os seus ‘poréns’.
Um caso
já bastante explorado da interação clara entre física e futebol é o fascínio
exercido pelos grandes batedores de falta, como o lateral Roberto Carlos (veja a análise física de um de seus incríveis
gols) e o meio-campista Juninho Pernambucano, cuja
versatilidade foi destacada por um físico inglês.
Esquema tático
Para dar
o pontapé inicial em Física do futebol, dois craques: o ex-jogador
Tostão e o físico Marcelo Gleiser são responsáveis pela apresentação do livro.
A publicação é dividida em quatro grandes capítulos: Movimento, Força, Energia
e Fluidos. Entre as questões abordadas pelos autores estão curiosidades como as
diferenças de jogar na altitude, as mudanças inesperadas na trajetória da bola
durante um chute com efeito e a interação de forças em uma dividida.
A cobrança de falta é um dos
lances mais claros da aplicação da física no futebol. Na imagem, cobrança de
Messi contra a Alemanha, na Copa do Mundo de 2010 – na ocasião, a Argentina
acabou eliminada. (foto: Flickr/ seriouslysilly – CC BY-NC-ND 2.0)
Na busca
por respostas, o livro aborda inúmeros conceitos que fazem parte do currículo
do ensino médio, como atrito, aceleração, inércia, quantidade de movimento,
resistência do ar, pressão, entre outros, de forma didática e sempre buscando
exemplos relacionados ao mundo do futebol.
No meio
de tanto conteúdo, há importantes e bem-vindos intervalos para retomar o
fôlego, onde se apresenta um pouco da história do futebol e da ciência por meio
de seus personagens. Os autores selecionam dois times de biografados para
ninguém botar defeito: do lado dos cientistas, aparecem Joule, Bernoulli, Euclides, Descartes, Pitágoras e Galileu. Einstein e Newton completam o grupo.
Entre os
boleiros, foram selecionados Charles Miller, Arthur Friedenreich, Mané Garrincha e seus dribles desconcertantes, Didi com seu chute folha-seca, além de Zico e da seleção brasileira de 1982.
Na frente, é claro, sua majestade, o rei Pelé, e o escrete
canarinho tricampeão mundial. No banco, os passes de calcanhar de Sócrates (que não ganhou
uma minibiografia) e as histórias da bola e do futebol. Como todo brasileiro
tem um quê de técnico, ausências de nomes como Roberto Dinamite, maior artilheiro do campeonato brasileiro, Rivelino e seus elásticos, o fenômeno Ronaldo ou Romário (de novo cortado da lista) serão sentidas.
Treino é treino, jogo é jogo
Apesar da informalidade, a obra
assemelha-se a um livro didático temático, com muitas fórmulas. É preciso certo
esforço para acompanhar a matemática exigida pela apresentação de conceitos e
exemplos na ‘prancheta’ dos ‘professores’ – para só então sair ‘na cara do gol’
e deliciar-se com interessantes análises físicas de escanteios venenosos e
chutes com efeito. Considerando-se essa proposta, a comissão técnica faz um bom
trabalho, montando uma tática redondinha e que dá resultado – é realmente
interessante rever conceitos de aula aplicados ao futebol.
Mas a
estratégia poderia se mostrar um verdadeiro ‘carrossel físico’, no que diz respeito à ousadia
e à inventividade, se o livro oferecesse mais exemplos e análises de lances
reais do futebol – um tira-teima utilizando a supercâmera da física. O ‘gol de
placa’ também bate na trave: há poucas propostas de exercícios práticos, que
estimulem os alunos a levar a física do livro diretamente para o campinho mais
próximo.
Apito final
Boa
leitura extraclasse, Física do futebol revela as relações entre esses
dois mundos muito próximos e pode ajudar alunos do ensino médio a compreender
melhor a ciência. Também pode servir de base para a introdução de novas
dinâmicas em sala de aula. Mas cabe ao professor superar a retranca e propor,
ele mesmo, atividades que complementem essa experiência – só assim levantará a
taça e conquistará mais torcedores para o Física Futebol Clube.
Marcelo
Garcia
Ciência Hoje On-line
Ciência Hoje On-line
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